dEUSES FALSOS - A idolatria da alma exclui os homens do céu



Texto por: Rafaella Leite


        O que nos deixa irados, ansiosos, ou desesperançados de forma descontrolada? O que nos atormenta com uma culpa da qual não conseguimos nos livrar? Aí estão os nossos ídolos! Eles nos dominam, uma vez que sentimos a necessidade de tê-los a fim de que a vida faça sentido.

        A idolatria consiste em substituir Deus por alguma coisa criada no coração, no centro da vida. É substituirmos coisas boas, como uma carreira profissional bem-sucedida,  o amor, os bens materiais e até a família e os converter em coisas essenciais. As endeusamos e tornamo-as o centro de nossa segurança, proteção, significado e realização. Mas o que acontece se essas coisas se esvaírem? 

        Isso acaba com você! Somos tomados por uma estranha melancolia, um desespero absoluto em consequência de edificarmos toda a nossa vida com base em uma alegria imperfeita desse mundo. Achamos que ídolos são coisas ruins, mas quase nunca isso é verdade. Qualquer coisa serve de deus falso, especialmente as melhores coisas da vida.


Mas como então criamos os nossos deuses e quais são as suas ‘categorias’?

        Quando um valor finito se torna um núcleo de valor pelo qual outros valores são julgados, então quem o fez escolheu e criou o seu deus. A bíblia usa três metáforas básicas para descrever como as pessoas se relacionam com os ídolos em seu coração. Elas amam os ídolos, confiam neles e lhes obedecem. 

        Há ídolos pessoais como o amor romântico e a família; ou o dinheiro, o poder e a conquista; ou o acesso a determinados círculos sociais; ou a dependência emocional de outras pessoas a você; ou a saúde, o preparo físico e a beleza física. 

        Há ídolos culturais como o poder militar, o progresso tecnológico e a prosperidade econômica. Os ídolos das sociedades tradicionais envolvem família, trabalho duro, obrigações e virtude moral, ao passo que nas culturas ocidentais eles são a liberdade individual, o autoconhecimento, a riqueza pessoal e a realização.

        Também pode haver ídolos intelectuais, com frequência chamados de ideologias. E ídolos em todo campo vocacional. No mundo dos negócios, a expressão do eu é suprimida pelo valor supremo, o lucro. No mundo da arte, entretanto, ocorre o contrário. Tudo é sacrificado à expressão do eu.


A Inevitabilidade da idolatria

        Todo ser humano precisa viver em torno de alguma coisa. Algo tem de cativar nossa imaginação, a aliança e a esperança mais fundamentais do nosso coração. No entanto, como nos diz a bíblia, sem a intervenção do Espírito Santo, esse desejo jamais será o próprio Deus.

        Todo falso deus que o coração pode escolher - amor, dinheiro, sucesso ou poder - tem uma narrativa bíblica poderosa para explicar como esse tipo específico de idolatria atua em nossa vida.

        Abraão e os ídolos pessoais (Gn. 22) - “Isaque”. Tê-lo e apegar-se a ele não oferece segurança espiritual alguma. Deus viu o sacrifício de Abraão e disse: “Agora sei que me amas, pois não me negaste teu único filho”. Mas até que ponto conseguimos olhar para o sacrifício divino na cruz e dizer a Deus: “Agora nós sabemos que nos ama. Pois não nos negaste teu filho, teu único filho, a quem amas”? Quando a importância do que ele fez começa a ficar clara para nós, torna-se possível, enfim, descansar o coração nele e não em alguma outra coisa. 

        A bíblia está cheia de relatos de personagens como José, Moisés e Davi, vivendo momentos em que Deus parecia abandoná-los, mas depois ficou claro que estava lidando com os ídolos destrutivos na vida deles e que isso só poderia acontecer quando experimentassem a dificuldade.

         Não temos como saber todas as razões pelas quais nosso Pai está permitindo que coisas ruins nos aconteçam, mas podemos confiar nele nesses tempos difíceis, nos regozijarmos ao lembrar do que ele fez em nosso favor e ter alegria e esperança para seguir nos tempos que parecem ser os mais obscuros e difíceis possíveis. 

        Jacó e Leia (Gn. 29) (em ambas as visões) - O amor não é tudo de que você precisa - fazer do amor um ídolo pode significar que o ser amado abuse e explore de você ou talvez cause uma terrível cegueira às patologias do relacionamento. Uma ligação idolátrica pode levá-lo a quebrar promessas ou a trair as alianças a fim de se manter agarrado a ela. Pode motivá-lo a violar todos os limites justos e adequados. Praticar a idolatria é ser um escravo. 

        O amor romântico é um objeto de enorme poder para o coração e a imaginação humana, por isso consegue dominar excessivamente nossas vidas. Até quem o evita por completo, em razão de amargura ou medo, na verdade está sendo controlado por seu poder. 

        Costuma-se dizer que “homens usam o amor para encontrar sexo, e mulheres usam o sexo para encontrar o amor”. Essa história revela que esses dois deuses falsos decepcionam. Porém, Leia conseguiu ser resgatada! Quando deu a luz a seu quarto filho, Judá, disse: “Desta vez louvarei ao Senhor”. Dessa vez não há menções de marido ou filhos, Leia entregou o coração para o Senhor e teve a própria vida de volta. Deus havia vindo ao encontro da menina que ninguém queria, a mal-amada, e a tornado mãe ancestral de Jesus. A salvação veio ao mundo não pela bela Raquel, mas pela desprezada Leia. O Senhor a amou! Isso faz-nos vencer essa idolatria. 

        Zaqueu (Lc. 19) - o dinheiro muda tudo - É difícil alguém que reconheça sua própria ganância, o modus operandi do deus dinheiro inclui a cegueira em nosso próprio coração. 

        Para entender o que os cobradores de impostos eram na época de Jesus, pense no que os colaboradores que, sob as ordens nazistas, faziam com seu próprio povo durante a Segunda Guerra Mundial. Zaqueu traiu sua própria família e povo em favor do dinheiro. Mas Jesus o encontro no alto de uma árvore e sua vida foi mudada. Naquele mesmo dia Zaqueu diz a Jesus que doaria 50% de seu salário e restituir quatro vezes mais a todos aqueles que prejudicou. A graça de Deus havia transformado sua atitude quanto a riqueza, a generosidade tinha invadido seu coração. E, agora, ao invés de o dinheiro ser sua segurança, ele era o meio pelo qual Zaqueu servia as pessoas. E aqui temos mais uma vez a prática de como sair da idolatria: entender que toda a nossa riqueza e segurança está em Cristo Jesus.

        Ídolos profundos e ídolos superficiais - Precisamos entender que cada ídolo “superficial” encontrado em nós - dinheiro, nosso cônjuge, filhos e afins - é uma busca de satisfação dos nossos “ídolos profundos” - poder, aprovação, conforto e controle. Para combater aquilo que se encontra em nosso coração, é impossível que tentemos mudar apenas de maneira superficial. É necessário mudar em nível profundo, de coração, e isso só vem mediante a fé no evangelho de Cristo. 

        Naamã (2Re 5) e o sucesso -  o rápido declínio de satisfação - Quanto ao ídolo do sucesso, este vem pela vontade de ser “de dentro”, uma pessoa de alta posição na sociedade, bem visto pelas pessoas e aprovado constantemente. Naamã tinha todas essas coisas, era comandante do exército do rei da Síria, um homem importante e respeitado pelo seu senhor, porém, era leproso; e sua doença contagiosa o afastava das pessoas. Essa história nos serve como parábola, A lepra de Naamã representa a realidade de que o sucesso não tem como nos entregar a satisfação que procuramos. Mas a história não acaba aqui! Uma mulher, serva da casa, então, diz que Naamã deveria procurar um profeta em Samaria e assim seria curado. O comandante então pega uma boa quantia em dinheiro e uma carta de recomendação [...], mas, se encontrando com Eliseu, o profeta, este diz apenas para que Naamã se banhe no rio para ser curado. Ele estava acostumado a realizar tarefas difíceis para obter o que queria, porém, se encontrou com um Deus de graça que, o que pede de nós e que nos despojemos do nosso “ser e fazer” para que nos apoiemos totalmente e somente nele. E aqui está o fim da idolatria do sucesso, sendo nosso maior exemplo o próprio Cristo, que veio como servo e nos serviu, esse sim foi o maior! É assim que Deus faz. 

        Nabucodonosor (Dn 2-4) e o poder - A idolatria política, de poder ou filosofias - O poder costuma nascer do medo, que, por sua vez, dá a luz a mais medo. Grande parte dos políticos buscam suas posições por conta do medo, mas percebem que este só cresce quando se assentam em suas cadeiras. Nabucodonosor era o rei mais poderoso de sua época, seguro em sua posição. Porém , após seu sonho ser interpretado por Daniel, reconheceu que existe apenas um “Senhor de reis”, e, por ele, prostrou seu rosto em terra. 

        Após o episódio, Nabucodonosor continuou a oprimir os povos e então veio o segundo sonho: Deus cortaria sua árvore, mas o tronco continuaria ali para crescer novamente - Deus não estava a procura de vingança ou destruição, a questão ali era disciplina, dor imposta com o propósito de correção e redenção. E assim se fez! Quando ele percebeu o senhorio de Deus sobre sua vida, se tornou um rei ainda mais forte. A insegurança se foi e o desejo intenso de poder foi cortado pela raiz. 

        Os ídolos ocultos - Até o momento falamos dos ídolos pessoais, que são fáceis de identificar, mas agora falaremos um pouco daqueles que são de difícil percepção.

        Ídolos em nossa cultura - Sociedades tradicionais tendem a fazer da unidade familiar e do clã um valor absoluto e supremo. Isso pode levar a assassinatos por honra, ao tratamento das mulheres como propriedade e à violência contra homossexuais. As culturas ocidentais seculares criam ídolos da liberdade individual e isso leva ao colapso da família e ao materialismo desenfreado. Quando estamos imersos em uma sociedade que considera normal determinada afeição idólatra, torna-se quase impossível discerní-la pelo fato de que é. 

        ìdolos em nossa religião - Estes podem vir em forma de considerar doutrinas mais importantes do que o próprio Deus e sua graça; de transformar dons espirituais e sucesso ministerial em deuses falso. De voltarmos a nós mesmos e para nosso esforço moral para controlar a Deus, as pessoas e obter a salvação - nesse exemplo podemos citar a história de Jonas (Jn 1-4)  - orgulho racial e mesquinhez cultural não podem coexistir com o evangelho da graça. 

        Os ídolos distorcem nossos pensamentos e sentimentos - quando algo “passa por cima” de nossos ídolos, tendemos a distorcer coisas e valores - vendo aquilo que é bom como mau e aquilo que é mau como bom. Porém, em Cristo, somos chamados a deixar de lado todo nosso egocentrismo e idolatria para dar lugar a um Deus que enxertou gentios em sua videira e serviu a todos os povos. 


O fim dos deuses falsos - descobrindo e substituindo seus ídolos

Como discernimos nossos ídolos?

         “Sua religião é o que você faz com sua solidão” - em outras palavras, o verdadeiro deus do seu coração é aquilo em que seus pensamentos se concentram sem o menor esforço quando nada mais requer sua atenção. 

        Outra maneira de discernir o verdadeiro amor é prestando atenção na maneira que você está gastando seu dinheiro. Seu dinheiro é usado com mais facilidade naquilo que é o amor supremo de seu coração. 

        Terceiro, qual a sua verdadeira salvação funcional do dia a dia? Verifique isso percebendo como você reage às orações sem respostas e às esperanças frustradas. 

        Por fim, veja quais são suas emoções mais incontroláveis. Aquelas que são mais dolorosas, de medo, desespero e culpa, que te motivam a fazer coisas que sabe serem erradas. Ao “arrancar suas emoções pela raiz”, você sempre descobrirá seus ídolos agarrados a ela. 

        

“Portanto, já que vocês ressuscitaram com Cristo, procurem as coisas que são do alto, onde Cristo está assentado à direita de Deus.  Mantenham o pensamento nas coisas do alto, e não nas coisas terrenas. Pois vocês morreram, e agora a sua vida está escondida com Cristo em Deus. Quando Cristo, que é a sua vida, for manifestado, então vocês também serão manifestados com ele em glória. Assim, façam morrer tudo o que pertence à natureza terrena de vocês: imoralidade sexual, impureza, paixão, desejos maus e a ganância, que é idolatria.” Colossenses 3:1-5

        O único modo de nos libertarmos da influência destrutiva dos deuses falsos é nos voltarmos para o Deus verdadeiro. O Deus vivo, que se revelou tanto no Sinai quanto na cruz, é o único Senhor que, quando encontrado vai satisfazê-lo e, caso você falhe, pode e de fato lhe perdoará. 

        Um último conselho: Seja paciente! Acredito que esse processo tomará nossa vida inteira. Cristãos maduros não são  pessoas que alcançaram o leito da rocha por completo. Antes, são pessoas que sabem como continuar a perfurar e estão chegando cada vez mais perto. 

        A quem posso buscar que seja tão belo para me capacitar a fugir de todos os deuses falsos? 

        Como escreveu o poeta George Herbert, olhando para Jesus na cruz: “És meu encanto, minha vida, minha luz, beleza única para mim”. 

        

"Não terás outros deuses além de mim. Êxodo 20:3


Referências

Livro “dEUSES FALSOS”, de Timothy Keller 

Bíblia NVI 


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Foto de Jorj na Pexels

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